quarta-feira, 14 de julho de 2010

É preciso se preparar para próxima cheia

Matéria sobre as enchentes em Pernambuco, em junho de 2010.

Publicado em 12.07.2010 no Jornal do Commercio/Pernambuco - caderno de Cidades


Em física, resiliência é a resistência de um material ao choque. Na medicina, é a capacidade de um paciente se recuperar de um trauma. Em catástrofes como a ocorrida mês passado em Pernambuco será a aptidão dos moradores das cidades ribeirinhas da Zona da Mata Sul e do poder público de se preparar melhor para as próximas enchentes. Obras mais baratas, como barragens, e mais caras, a exemplo dos diques, estão entre as mudanças a serem adotadas para melhorar a resiliência da população. “Mas a postura tanto das pessoas que vivem nesses locais, quanto dos governantes, será fundamental para perceber que todo rio tem pelo menos uma cheia por ano. Faz parte do ciclo hidrológico. A Terra é assim”, diz Jaime Cabral, coordenador da pós-graduação em engenharia civil e chefe do Laboratório de Hidráulica da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

O pesquisador lembra que a enchente do dia 18 do mês passado foi o que os meteorologistas chamam de evento extremo. Em um dia, choveu 40 milhões de metros cúbicos. Foram 400 milímetros – cada milímetro equivale à precipitação de um litro de água por metro quadrado –, o maior índice pluviométrico registrado num curto período de junho nos últimos 30 anos.

Para os arquitetos, um melhor planejamento urbano ajudará a aumentar essa resiliência. “É preciso pensar que as cidades não são apenas compostas de equipamentos como escolas e postos de saúde. A reconstrução deve incluir arranjos produtivos que gerem empregos e a mobilidade urbana. Ruas mais largas, por exemplo, poderão antecipar o futuro, como Niemeyer fez em Brasília”, diz a presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-PE), Vitória Régia de Lima Andrade.

“As pessoas não perderam só os móveis, as casas. Ficaram sem seus empregos. Uma reconstrução tem que incluir tudo isso. É preciso atrair indústrias, serviços e negócios. É o que chamamos de urbanismo de emergência.”

A dona de casa Severina dos Ramos Gomes, 41 anos, não entende de teoria urbanística. Mas sabe que se voltar para a beira do rio, na Vila do Una, em Palmares, na Mata Sul, corre o risco de ter a casa novamente destruída na próxima cheia. “Queria sair daqui, mas não tenho para onde ir. Disseram que iam tirar a gente. Levar para um lugar mais alto, longe do rio. Mas já disseram isso de outras vezes e nada aconteceu. Só me resta esperar”, diz, enquanto retira a lama dos poucos móveis que conseguiu salvar antes da casa ruir.

A localização e a infraestrutura das feiras livres também é apontada pelo IAB-PE como uma questão a ser levada em conta. “Nas cidades do interior, a feira livre é uma vocação ainda muito forte. E, ao contrário das metrópoles, em que os centros estão se tornando áreas degradadas, no interior ainda é o lugar onde se encontra tudo, de peixe a sapato”, diz a arquiteta.

Vitória Régia recomenda que o poder público tente orquestrar as intervenções para que o posto de saúde não fique longe da escola e da creche. “Se ficar o posto por conta da Secretaria de Saúde e a escola e a creche a cargo da Secretaria de Educação, vai se perder a oportunidade de conceber cidades divididas em setores, que é uma tendência urbanística. Essa também é a hora de dimensionar os equipamentos urbanos. Existem parâmetros para indicar quantas unidades de saúde e estabelecimentos de ensino devem ter, de acordo com a população”, esclarece.

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